A 2 dias das 20 semanas ir às compras já me parece uma tarefa ciclópica.
Hoje estávamos no supermercado a fazer compras. Ironicamente estamos num país onde está sempre calor, mas nunca passámos tanto frio na vida... Os centros comerciais estão a 18ºC e lá fora continuamos acima de 35ºC.
Então, como eu dizia, estávamos no supermercado, na zona dos frios a escolher iogurtes e, claro, deviam estar uns 15ºC naquela zona e nós com roupas para temperaturas acima de 33ºC. O Afonso começa a dizer que está cheio de frio, que temos que nos despachar e eu digo que temos que ir com calma para não nos esquecermos de nada.
Isso para ti e para a Francisca é fácil, vocês têm essa gordura toda que vos protege do frio!
Aqui os médicos não fazem uma cara escandalizada quando confrontam a minha idade com a minha paridade.
Os nossos filhos são raros: são dos poucos que são levados ao parque pelos pais e que não têm nanny a tomar conta deles nas festas e passeios de família.
Espero eu. Na 5ª feira quando fui buscar o Afonso a professora quis falar comigo. Vão pô-lo na sala dos 4 anos, aqui chamada "Reception Class". Ele estava numa turma de ESL (English as a Second Language) em que iria obter as bases da língua para depois ir para a turma a que corresponde a idade dele. O problema (e eu vi logo que isto poderia acontecer) é que, no curriculum inglês as crianças entram para o primeiro ano com 5 anos. E é suposto que nesse primeiro ano já saibam ler e escrever. Ora em Portugal o Afonso iria começar este ano o ensino pré-escolar; só aí teria as bases que de acordo com o plano inglês já deveria ter. Assim, em vez de o avaliar pela idade, avaliaram-no pelas competências demonstradas naquelas matérias que para o ensino deles é relevante. Para mim foi um alívio, porque como se não bastasse ter de se adaptar e aprender a nova língua, ainda seria colocado numa turma em que dificilmente iria conseguir acompanhar os outros miúdos, que já sabiam à partida ler, escrever e falar inglês com fluência. No ano de adaptação isto ia ser muito "pesado" para ele. Ele também deve ter ficado aliviado. Nesta turma vai ter o ambiente de "jardim de infância" a que está habituado e acho que vai poder aprender muitas coisas de uma forma mais descontraída.
A maior parte dos "expats" que aqui vive diz que demorou um ano a começar a gostar disto. Já só falta pouco mais de dez meses...
Vou pôr um fato na limpeza a seco. Descrevo as nódoas e os sítios onde é preciso estarem mais atentos; até aqui tudo corre bem (se calhar porque não houve muita oportunidade de interacção). A senhora filipina que me atende diz que estará pronto na 4ª feira à noite ou 5ª feira de manhã.
E eu pergunto-lhe: "Amanhã à noite ou depois de amanhã de manhã?", numa espécie de confirmação do que me acabava de dizer.
Ela responde:
- No, not tomorrow!! The other wednesday or thursday, because these hard removing stains must go to our central store, they cannot be cleaned here.
- Ok, so you're telling me that the suite will be ready to deliver next 28th or 29th October, right? (já me habituei a recapitular 20 vezes e a sistematizar toda a informação que me fornecem)
- Nooooo!!! Not that late!!!
Pega no calendário, olha para ele e diz-me:
- 21st or 22nd October.
- Well, 21st or 22nd is tomorrow or the day after, digo eu, com ar confuso.
-Yes, of course! Diz a senhora, decidida.
...E não me venham mais dizer que vida de dondoca (ou housewife, como sou aqui conhecida) é o paraíso.
Cliente com sotaque inglês de Portugal fala com alguém com sotaque inglês do Paquistão ou da Índia (há diferenças, muito ténues, ainda não estou especialista):
-Good afternoon; I would like to know if you supply water and water dispensers for residential customers.
-Yes, Madam (outro nome que me chamam frequentemente). In which area do you live?
-In Tala Island.
-Hmmm.... Tala Island. I don't know that place...
-Well ..., Tala Island, inside Amwaj Islands...
- Ahhhh, Tala Island!!!!
- Yes, Tala Island.
Depois vem uma descrição pormenorizada dos produtos e promoções existentes (da qual me escapou metade devido à minha péssima capacidade de interpretação do inglês com sotaque paquistanês/indiano). Entretanto o senhor pergunta-me novamente a zona onde estou e eu respondo-lhe novamente, só que desta vez identificou o sítio à primeira. Depois pede-me mais dados. O número da porta. Eu digo-lhe.
-Impossible. In Tala Island the building numbers only have four digits.
-Well, not this one - respondo eu, com a infinita paciência que já me habituei a ter neste sítio- This one has 5 digits, I can assure you.
Depois de repetir 3 vezes a morada completa (que consta de número de apartamento, número do edifício, número da estrada e localização), o bendito senhor pergunta-me o nome do edifício.
-It's the Palm, digo eu.
-See?? Palm!!! Four digits!!!
No fim combinamos uma hora para a entrega da água. Ele recapitula a morada e no fim:
-Tala Island? Where is Tala Island?
Acaba de me telefonar uma senhora a perguntar se preciso de empregada. Digo-lhe que sim e a conversa desenrola-se normalmente. Condições, localização, horário de trabalho, etc... Entretanto pergunta-me de onde sou. Quando digo Portugal, desliga-me o telefone na cara e não volta a ligar...
Triste Fado?
Tudo a postos, uniforme pendurado e pronto a ser vestido, a lancheira pronta para receber a comida, a pasta pronta para levar e de repente aparece uma febre e desarranjo intestinal a adiar os planos de regresso às aulas...
...fotografias de todos os carros dourados que vejo, não fazia muito mais na vida.
(mas é melhor não falar muito porque ainda não temos um carro definitivo e o mercado dos usados está cheio de carros dourados; ainda me sai um na rifa)
Devia ter ido à loja dos uniformes escolares antes de descolher a escola. Tinha repensado seriamente a minha escolha. Vão passar o ano lectivo mais mal vestido da vida deles.
Coitadito, não tem tido grande destaque aqui no Umbigo. A verdade é que, até há uns dias nem se fazia sentir... Agora já o sinto de vez em quando e cá fora também já se faz notar. Estou naquela fase em que a roupa de grávida ainda me parece exageradamente grande mas a roupa normal já não aperta com facilidade. Ando bem disposta e para a semana vou à consulta no Hospital Americano. Às vezes sou assaltada por cãimbras, coisa que só tive na gravidez do Afonso (estou à espera das teorias sobre semelhança entre sintomas na gravidez e o sexo deste bebé). A excitação sobre se vai ser menino ou menina cá em casa é tão grande que os meus planos iniciais de não querer saber o sexo não vão dar para cumprir. Todos os dias o Afonso e a Francisca falam nisso com uma expectativa enorme e seria impensável mantê-los até ao nascimento sem saber... Eles acham que até Março falta muito tempo, eu vou explicando que é uma espera necessária e saudável; mas eles queriam que fosse amanhã (acho que eles não se apercebem que o bebé ao princípio não vai ser propriamente um companheiro de brincadeiras, pelo contrário).
O calor dá-me uma grande vontade de dormir sestas e às vezes não consigo mesmo resistir à tentação de dormitar (a Francisca pede-me muitas vezes companhia ao princípio da sesta e às vezes adormeço primeiro que ela).
Bem, está na hora de a acordar da sesta e ir dar um mergulhinho à piscina!!
E já não penso todos os dias em voltar para casa, mas também ainda não me sinto em casa. A pouco e pouco vamos construindo as nossas rotinas e vendo algumas coisas que podemos fazer por cá. As crianças já têm escola; espero ter acertado na escolha. O colégio é inglês, que era uma das nossas preferências, mas parece não ter aquela rigidez dos colégios ingleses típicos, o que neste ano de adaptação me parece ser uma vantagem...
Já me habituei ao calor; a verdade é que tem estado menos húmido. Quando estão 35ºC já dou por mim a pensar que está um dia bastante agradável. Ou seja, se no Verão tivermos que fazer praia na Ericeira, Sintra ou Peniche vamos sofrer um bom bocado.
Já me habituei:
- a ver pessoas bastante diferentes de mim, seja na maneira de vestir, seja na maneira de estar;
- a ver um homem com as suas várias mulheres e filhos sem estranhar, embora sinta sempre curiosidade em perceber como se relacionam todos uns com os outros;
- a ver nas estradas pessoas que, mesmo sem beber bebidas alcoólicas, conduzem como se tivessem bebido, e bastante;
- a ver porsches, maserattis, todo o tipo de carros de luxo e carros que nem imaginava existirem na mesma proporção que via renaults mégane e seat ibiza nas estradas de Lisboa (com a diferença que aqui as cores maioritárias dos carros são branco e dourado);
- a ter que esperar 10 a 15 minutos por uma refeição de "fast food" (conceito que, aqui, definitivamente, não existe);
- a ter que repetir várias vezes as mesmas coisas para que me percebam; e, ainda assim, quase nunca nada sair como eu pedi inicialmente;
Vou-me habituando:
- a ir ao supermercado e existir uma pessoa em cada caixa só para arrumar as compras dos clientes (e às vezes, a pedido destes, carregar as compras até ao carro);
- a ir às casas de banho dos centros comerciais e haver sempre uma pessoa a limpar imediatamente todas as gotas de água que salpicam quando as pessoas lavam as mãos;
- ao facto de toda a gente ter empregados para tudo e para nada, a custar uma verdadeira ninharia por mês;
- a ver prédios de mais de 30 andares ao lado de outros de 4, em cima das estradas, sem estacionamentos, com acessos completamente inadequados à dimensão que se pretende dar a zonas supostamente de negócios e empresariais;
- a ver autocarros dos anos 80 com empregados da construção civil apinhados lá dentro, sem ar condicionado, com grades nos vidros, que vão sempre abertos;
- a ver que, para cada tarefa aparentemente simples, contrata-se sempre o triplo de pessoas de que se necessita, apenas porque a mão de obra é ridiculamente barata.
Não me habituo:
- a saber que há pessoas aqui a trabalhar todos os dias da semana, sem folgas, por cerca de 100 dólares por mês;
- à paisagem estranha desta cidade, que é na sua maioria, feia e com aspecto degradado, onde proliferam casas com uma "arquitectura" a que, definitivamente, é difícil habituarmo-nos;
- ao desperdício que se vê em todo o lado (de água, de energia, de comida).
a horta já tem direito a etiqueta e tudo
futebol mas só porque estamos em alturas